Nossa cidade conta com o Plano de Ação Climática do Município de São Paulo (PlanClima SP), que apresenta como objetivo orientar a ação do governo municipal para incluir a variável climática em seu processo decisório. Ou seja, as decisões governamentais precisam considerar que o clima está mudando e essa variação impõe alterações no conhecimento disponível e nas práticas implementadas pela Prefeitura do Município de São Paulo (PMSP).
Ao tratar das altas temperaturas de calor, o PlanClima indica:
Áreas verdes contribuem tanto para a manutenção da qualidade de vida dos residentes da cidade, ao diminuir efeitos como ilha de calor urbana e a poluição atmosférica, quanto para a diminuição de riscos de eventos extremos.
As áreas verdes presentes no Município são relevantes para a biodiversidade, promovem o aumento da permeabilidade, reduzindo os alagamentos e enchentes, contribuem para a manutenção das temperaturas mais amenas.
Como forma de minimizar e evitar a formação de ilhas de calor, recomenda-se o aumento das áreas verdes na cidade, aumentando o conforto térmico humano nas áreas urbanizadas.
Só que não
O distrito
Barra Funda, onde fica o bairro da Água Branca, é área de várzea do Rio
Tietê, sofre com inundações, com impermeabilização do solo, depende de
obras de drenagem, de Soluções Baseadas na Natureza (SBNs) e de preservação das
atuais e de ampliação das áreas verdes. É o distrito com menor número de áreas
verdes da Subprefeitura Lapa. Das 254 praças distribuídas nos 6 distritos da
Subprefeitura, apenas 19 ficam na Barra Funda - agora, 16 praças.
Nas duas situações de remoção de árvores, as decisões da Prefeitura ignoraram os objetivos e diretrizes do Plano de Ação Climática, as metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), ignoraram que a população já sofre com o calor, com inundações, com redução de áreas verdes públicas e com as consequências de matar árvores e impermeabilizar solo, e não foram cumpridos legislação, trâmites administrativos e regras de uso e ocupação do solo.
Praça Marechal Carlos Machado Bittencourt
Custo de uma obra pública que a população da Lapa não pediu: Três MILHÕES, oitocentos mil reais
A Prefeitura de São Paulo contratou em 2020, por R$3.864.654,82, obra que vai transformar esta praça pública em um campo de futebol, com grama sintética, arquibancada, banheiro, vestiário, com essa estrutura toda cercada com grades, e estacionamento [SEI 6044/2020.0003098-31]. Esta intervenção foi solicitada pelo ex-vereador e atual secretário adjunto da Secretaria de Esportes, Claudinho de Souza (PSDB) [SEI 6510/2020.0019693-0] e depois, pelo vereador Fabio Riva (PSDB) [SEI 6044/2020.0003098-3]. Em reportagem ao Jornal da Gente, em abril deste ano, o Secretário Claudinho informou que depois de construído, o espaço será entregue pela Subprefeitura Lapa à Secretaria de Esportes, que fará a cessão de uso para a constituição de um Clube da Comunidade (CDC), para uso do time do Esporte Clube São Bento do Piqueri, "que por conta das obras da alça de acesso da ponte ligando o bairro à Lapa, ficou sem local para treinar".
Transformar praça em campo de futebol, e matar árvores para isso, não é demanda dos moradores da região. Não passou por consulta pública, como determina a Lei 16.212/2015, sobre Gestão Participativa de Praças, e nas consultas públicas realizadas pela Prefeitura em 2021, 2022 e 2023 para identificar 5 prioridades da população de cada Subprefeitura para o Projeto de Lei Orçamentária Anual, não houve demanda de campo de futebol. Para o PLOA 2023, PLOA de 2022, PLOA de 2021, as prioridades da população da Subprefeitura Lapa foram saúde, educação, drenagem, melhoria das praças, ampliação de áreas verdes e mobilidade.
Impermeabilização e diminuição de áreas verdes
Embora a licitação da obra tenha sido concluída em 2021, somente em março de 2022 a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (SVMA) analisou o projeto do campo de futebol e proposta de manejo arbóreo. Na Informação Técnica 452 [SEI 6027.2021/0016418-0 ], a Coordenação de Planejamento Ambiental da SVMA demonstrou a escassez de Áreas Verdes Públicas no entorno da praça, que está situada na área inundável do Córrego do Curtume e Canal do Rio Tietê; analisou parâmetros do PDE e encaminhou para a Subprefeitura Lapa parecer concluindo que a "implantação de quadra esportiva na Praça Marechal Carlos Machado Bittencourt, como proposto pela construtora interessada, não atende aos parâmetros acima citados do PDE/2014 e LPUOS/2016. Sendo importante destacar, mais uma vez, a importância ambiental da Praça Marechal Carlos Machado Bittencourt, cuja função de área permeável, possibilitando a drenagem de águas em local anteriormente lacustre junto aos brejos e antigos meandros do Rio Tietê, deve ser preservada, sobretudo considerando a escassez de áreas verdes públicas na região".O extrato do Termo de Compromisso Ambiental TCA 001/2023, publicado no Diário Oficial da Cidade em 07 de fevereiro de 2023 descreve as árvores que serão cortadas ou preservadas e que a eficácia das autorizações está condicionada à "juntada aos autos da aprovação através de análise técnica de memorial técnico descritivo que comprove a permeabilidade da grama sintética utilizada para composição da área permeável." A Subprefeitura Lapa informou no processo que fez mudanças no projeto para ajustá-lo ao TCA, mas o novo projeto não foi analisado pela CPA/SVMA, para conferir se as mudanças atendem ao solicitado - área total que será impermeabilizada para implantar o campo de futebol com grama sintética, para arquibancada, vestiário e estacionamento, bem como foi previsto o plantio de árvores na área restante.
Matança de árvores
Imagens aéreas de Danilo Verpa/ Folhapress publicadas em 03/10/2023
Informações relevantes não consideradas pela Prefeitura
- A Informação Técnica 452 SVMA/CPA/DEAPT 2022 demonstrou que a área onde está a praça é classificada como AVP-1 (conforme o artigo 27 da Lei 16.402 de 2016, Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo – LPUOS) impondo assim a aplicação do artigo 275 do PDE (Lei 16.050 de 2014 e artigo 30 LPUOS) e que o projeto original do campo de futebol não atendia o solicitado em lei. A Subprefeitura Lapa informou, no processo, que ajustou o projeto para que atendesse aos parâmetros designados, porém, o quadro de áreas aponta valores de área impermeável diferente do outro quadro apresentado na mesma planta do mesmo processo, gerando assim dúvidas quanto aos valores das áreas apresentados. E no processo não consta nova análise da SVMA para verificar os ajustes.
- A área ocupada pela praça não é área denominada como Patrimônio Ambiental pelo Decreto 30.443/1989. Porém a área verde apresenta vegetação significativa de acordo com Lei 17.794 de 2022, vigente atualmente, conforme informa o Relatório Técnico de Vistoria 714/CLA-DCRA-GTMAPP. Sendo assim, deve seguir o Decreto 61.859 de 2022, que em seu Artigo 3° normatiza que para áreas verdes públicas, tais como praças, áreas livres, canteiro central e calçadas, é necessária autorização da Subprefeitura para manejo de exemplares arbóreos, e não somente a autorização dada pela SVMA por meio do TCA (disciplinado pela Portaria 130 de 2013, da SVMA).
- No Despacho assinado pelo Secretário do Verde e Meio Ambiente foi utilizada a antiga Lei 10.365 de 1987, que não exime a necessidade de autorização do Subprefeito responsável. O artigo 12º desta lei determina que a execução do manejo em logradouros públicos só pode ser realizada por funcionários da prefeitura (incluindo terceirizadas) e concessionárias previamente autorizadas pela Subprefeitura. Mas não foi isso que aconteceu. As árvores já foram cortadas e o manejo não foi realizado pela Subprefeitura Lapa e sim pela empresa contratada para execução da obra do campo de futebol.
- Outro fator que em nenhum momento foi levado em consideração no processo é a da existência no local de plantio de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). Nesse caso esse plantio era responsável por compensar danos causado em áreas adjacentes. Isso significa que nesse momento o dano causado anteriormente já não está sendo compensado.
- A manutenção da área com sua cobertura vegetal e solo natural é de extrema importância para uma região localizada na várzea do Rio Tietê. A troca de solo natural por piso drenante não mitiga a diminuição da retenção da umidade no local, visto que o solo sob ele estará completamente compactado.
A Subprefeitura Lapa não realizou a consulta pública à população sobre mudança de uso da praça, como prevê a Lei 16.212/15 sobre Gestão Participativa de Praças.
Mobilização da sociedade
Em janeiro de 2022, o Movimento Água Branca denunciou, em matéria deste blog Atenção Estamos perdendo áreas públicas , que áreas verdes da Água Branca estavam sendo destinadas pela Prefeitura para outros usos, entre elas a Praça Marechal Carlos Machado Bittencourt. A denúncia foi enviada ao Ministério Público pelo Movimento Defenda São Paulo, e a promotoria de Justiça de Meio Ambiente instaurou inquérito civil [MP, PJMAC, IC 13/2022].
O Conselho Regional de Meio Ambiente, Desenvolvimento Sustentável e Cultura de Paz – CADES Lapa, nas suas reuniões mensais realizadas em 2022, tratou desse assunto com grande preocupação e deliberou, em 16 de março de 2022, posicionamento pela manutenção da Praça Marechal Carlos Machado como área verde e praça, contrário à mudança de uso para transformá-la em campo de futebol. Em janeiro, o CADES Lapa, apresentou denúncia ao Ministério Publico [MP, PJMAC, IC 35/2023; PJHURB IC 54/2023], em março de 2023 apresentou seu posicionamento e preocupações com a mudança de uso da Praça Carlos Machado Bittencourt à Secretaria do Verde e Meio Ambiente, em reunião realizada com Secretário Adjunto Carlos Eduardo; mantém acompanhamento do processo e envio de informações ao Ministério Público.